sexta-feira, 25 de julho de 2014

Ela?


“Ela? A pessoa mais linda que já conheci. E quando digo linda, me refiro a todos os pontos que você acabou de pensar, e talvez até você subestime tamanha beleza para uma só pessoa. Mas acredite, ela era realmente linda. Tinha os olhos mais enormes que uma pessoa possa possuir, mas não era nada exagerado, ou pelo menos, não demonstrava ser, pois tudo nela era proporcional. Olhos grandes, sorriso enorme, bochechas redondas e deveras fofas, sem falar no corpo dela, ela era muito corpulenta. Contudo, era baixinha; uma completa anãzinha. Mas você não imagina a força que se escondia naquela “tampinha”. O soco dela poderia nocautear o Anderson Silva, com toda certeza. Ela daria uma boa boxeadora, ou não. Por que ela era sensível, mesmo com toda a valentia era sensível, e também frágil, posso admitir. Mas isso não fazia dela uma garotinha da mamãe. Ela sempre correu atrás dos seus sonhos, por mais loucos que eles fossem. Acredita que uma vez ela me ligou dizendo que queria viajar pelo país inteiro?! Sim, e ela o fez, mas em sonhos; obviamente, os pais dela não o deixaram acontecer de verdade. Mas, por mais absurdo ou louco que pareça, eu viajei com ela. Fomos a todos os lugares que você possa imaginar. Visitamos não só o país que residíamos, mas também o mundo inteiro. Pergunte “Quem foi a paris na semana passada?” e com toda convicção te direi que eu e ela fomos. Foi divertido conhecer a Torre Eiffel, e também aquelas florestas que, eu não queria, mas ela insistiu que visitássemos cada lugar, eu não iria se não fosse com ela. Tudo ao lado dela ficava bom (até comer feijão). O maior problema de tudo isso era eu saber que ela escondia algo de mim, notei isso desde a primeira conversa, ou até tenha sido antes, quando ouvi falar dela. Ela agia como se sua vida fosse limitada, sempre queria que as coisas pudessem acontecer logo ou que acabassem logo também para que ela pudesse fazer outras coisas. Ela saia do ballet, corria para a faculdade, ia para o trabalho, vinha na minha casa, visitava a sua vó, e o mais importante, beijava a sua mãe. Acho que para ela essa era a sua atividade diária mais importante, pois não dormia sem antes dar um beijo em sua mãe. Com o tempo, acabei juntando as peças, fui descobrindo que não havia como decifrá-la, por que isso faria com que a minha visão de garota “forte e sensível” se acabasse, eu não podia defini-la, não podia questioná-la, então sempre segui a risca tudo o que ela me falava. Se ela dizia para mim “Por favor, não faça isso”, eu fazia mais umas duas ou três vezes só para confrontá-la. Porém não fazia isso sempre, mas é que eu adorava vê-la com raiva. As maçãs do rosto dela cresciam, suas bochechas coravam, e ela? Ah, ela corria atrás de mim até se cansar, ou me alcançar, coisa que quase nunca acontecia, só mesmo quando eu deixava; sempre corri mais que ela. Essa garota me fez feliz por muito tempo, não poderia contar, nem estimar, sabe?! Isso faria com que eu percebesse que não foi por tanto tempo assim.Aconteceu justamente no pior dia da minha vida. Ela chegou e me perguntou “Se amanhã fosse o meu último dia, o que você me diria?”. Eu a xinguei, blasfemei contra ela e apertei-a contra a parede, dizendo “Nunca mais repita isso, tá me ouvindo?”. E então ela começou a chorar, descontroladamente e me deixou ali, de pé olhando para o lugar que ela deveria estar se não tivesse saído correndo e me deixado ali, estupefato. Minutos depois, eu caí na real… Não deveria ter feito aquilo com ela, mas a verdade era que eu não tinha uma resposta. Não estava preparado para responder aquilo, na verdade queria questionar o porquê dela ter me feito àquela pergunta duma hora pra outra. O dia se seguiu e eu decidi dar um tempo para ela, eu a magoei, mesmo sem querer a magoei. Passei a noite me controlando, esperando uma mensagem dela me chamando para sair, ou fazer mais uma de nossas loucuras e nada. Meu orgulho ferido não me deixava dizer nada, fazer nada a respeito e então decidi ver fotos dela. Sei lá, sabe?! De repente bateu uma saudade imensa dela e eu não sabia como controlar. Logo, me peguei em lágrima, estava chorando sem parar, berrando, devo admitir. Perguntava-me “Como será que aquela ‘tampinha’ está?”, mas eu sozinho não conseguiria saber. Eu adormeci, tive pesadelos, e decidi me levantar. Precisava ver aquela garota e sei lá, dizer ao menos que eu não conseguiria responder, até por que nós éramos jovens e nada de preocupante poderia nos acontecer. É, isso foi o que eu havia pensado antes de chegar a casa dela e não encontrar ninguém. Imaginei que ela tivesse ido dormir fora, como era de costume, mas por que os pais dela não estariam? Gritei, berrei, joguei pedrinhas, até um vizinho surgir e dizer “Dá pra parar de berrar, queremos dormir!”, eu não me importei e só fiz perguntar “Você sabe onde eles estão?”, o vizinho, de cara amarrada, respondeu “Foram todos para o hospital, a filha deles não estava passando bem”. Mas eles só tinham uma filha, só podia ser ela. Corri em direção ao ponto de táxi mais próximo e fui em direção ao hospital (sorte minha a nossa cidade ter somente um hospital). Chegando lá, encontrei os pais dela, chorando e eu nem consegui perguntar o que estava se passando, talvez ela tenha se machucado, ou sei lá o que. Abri a porta que estava atrás deles e os médicos já estavam retirando ela de lá, percebi que os aparelhos estavam fazendo aquele barulho de quando a pessoa morre. Mas talvez eles tenham desligado para transferi-la. Para onde eles estavam levando a minha garota “forte e sensível”? Quando ela iria acordar para rir comigo de novo? Quando iríamos repetir todas as nossas atividades malucas? Você já deve saber a resposta né… Infelizmente nunca mais eu vi aquele sorriso. Nunca mais fiz viagens malucas depois daquele dia.Sabe o que mais dói nisso tudo? É saber que as minhas últimas palavras para ela foram “Nunca mais repita isso, tá me ouvindo?” e realmente ser verdade. Ela nunca mais repetiu nada depois daquele dia. Se eu pudesse voltar atrás, eu contaria a nossa história para ela. Assim como estou contando para você. Dê valor às pessoas que estão perto de você e nunca diga nunca para elas. Sente-se com ela, recorde os momentos bons e ruins, ria e sempre encerre suas frases com palavras boas, pois você não sabe quando essa pessoa vai te deixar e quando eu digo deixar, não é de abandonar, pois sei que, onde quer que a minha garota “forte e sensível” esteja, ela está comigo, ela só fez uma viagem da qual não fui convidado a ir, não por enquanto, mas a minha passagem já está comprada, numa poltrona ao lado dela e então faremos nossas viagens malucas, eu sei.”
Nunca diga nunca - Enzo Menezes.    


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